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Reforma da Previdência

19 de julho de 2017

Por Thayanne Magalhães

Lei “incentiva” a redução de benefícios concedidos a trabalhadores acometidos por doenças

Especialista explica que “Bônus Especial” pode levar médicos legistas a diminuir a quantidade de beneficiados pela Previdência

Foto: Valdecir Galor/SMCS

A Reforma da Previdência, proposta pelo atual presidente da República, Michel Temer (PMDB), tem levantado muitas polêmicas desde que começou a ser discutida. Um detalhe chamou a atenção do diretor jurídico do Sindicato dos Servidores Públicos Federais da Educação Básica e Profissional no Estado de Alagoas (Sintietfal), Yuri Buarque: a lei nº 13.457, de 26 de junho de 2017, resultante da aprovação e conversão pelo Congresso Nacional da medida provisória nº 767, de 6 de janeiro de 2017.

“Isto é, o que já vinha sendo praticado desde janeiro deste ano, via medida provisória de autoria do ilegítimo presidente da república, Michel Temer, agora foi transformado em lei. Numa interpretação literal, essa nova lei promove alterações nos prazos e características dos planos de benefícios da Previdência Social, assim como na composição remuneratória das carreiras de médicos peritos do INSS, instituindo o que chama de ‘Bônus Especial de Desempenho Institucional por Perícia Médica em Benefícios por Incapacidade (BESP-PMBI)’. Isso significa que o médico perito vai receber R$ 60,00 a mais por cada perícia que realizar para além do seu horário de trabalho em pessoas que são beneficiárias do auxílio-doença ou da aposentadoria por invalidez”, explicou.

Para Yuri Buarque, a nova lei é “a expressão clara de um esforço assombroso do governo federal em cassar benefícios concedidos a segurados do INSS”.

“Não por acaso, essa lei já é referida, até nos veículos de comunicação oficial do próprio governo – que não tem mais qualquer pudor em relação a esse objetivo pernicioso -, como ‘lei do pente-fino’”, destacou.

O diretor jurídico afirma que essa lei dá continuidade a um grande processo de revisão iniciado com a edição do MP 767/2017, cujo propósito é reduzir drasticamente a quantidade de benefícios concedidos a trabalhadores acometidos por doenças e circunstâncias que os impossibilitam, temporária ou definitivamente, de trabalhar, e os médicos que se dispõem a realizar tais perícias não ignoram esse propósito do governo federal.

“Sem sombra de dúvidas, o que se revela diante de nossos olhos é um cenário de gritante imoralidade, em que médicos estão sendo, na prática, monetariamente estimulados a retirar benefícios previdenciários de pessoas que deles precisam. Mas não apenas isso. Trata-se também essa lei de uma engenhosidade que flagrantemente vai na contramão do que preconiza a Constituição Federal de 1988, uma vez que se destina a restringir a cobertura e dificultar o acesso dos cidadãos à seguridade social”, afirma.

“É claro que os médicos peritos e demais profissionais que trabalham no INSS precisam ser valorizados, e isso perpassa pela necessidade uma remuneração justa e de melhores condições de trabalho, tanto em termos estruturais como a partir da contratação de pessoal, para, exatamente, garantir uma melhor prestação do relevantíssimo serviço público prestado por tais profissionais, para que o público usuário, razão de ser e destinatário final da existência do próprio órgão, possa ser atendido de forma humanizada e atenciosa, e não como meros papéis sobre a mesa a serem despachados em ritmo de fábrica, com vistas à produtividade”, continuou.

Mudanças

Yuri Buarque explica que as mudanças da lei 13.457/2017 não se resumem ao pagamento de bônus para médicos peritos que revisem, no intuito de cassar, benefícios previdenciários.

“Aliás, o simples não comparecimento à perícia agendada já implica na suspensão ou até no cancelamento sumário do benefício. E mais: por exemplo, esta lei também tem a audácia de instituir aquilo que a jurisprudência dos tribunais há muito tempo vem reiterada e majoritariamente condenando: a chamada ‘alta programada’. Ou seja, a nova lei permite que, ao conceder o auxílio-doença a um trabalhador, o médico perito já determine o dia em que este deve voltar a trabalhar, independentemente de realizar uma nova perícia para verificar se o trabalhador já está realmente curado ou se seria necessário estender o benefício”, explica.

Além disso, segundo Yuri Buarque, a lei aumenta o tempo de carência para a concessão de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e salário-maternidade a pessoas que pararam de contribuir com o Regime Geral da Previdência Social e agora decidiram (ou só agora puderam) voltar, dificultando o acesso a tais benefícios.

“A propaganda governamental diz que o objetivo do pente-fino é direcionar os benefícios para quem realmente precisa. Puro engodo. A verdadeira função dessa lei é criar condições para a diminuição do papel da Previdência e da Seguridade Social como um todo – composta pelo tripé previdência, saúde e assistência social -, pavimentando terreno para a implantação de ideais de privatização, e ainda garantir a destinação de cada vez mais recursos da Seguridade Social para sangrarem dos cofres públicos, por meio do mecanismo inconstitucional da Desvinculação de Receitas da União [DRU], vertendo-se em pagamento de uma infindável dívida pública que, em desobediência frontal a preceito expresso da Constituição [art. 26 do ADCT], nunca foi auditada”, continuou.

Por isso, segundo o diretor jurídico do Sintietfal, é extremamente importante entender a “lei do pente-fino” de forma não isolada, mas como mais uma peça da engrenagem de desmonte do Estado brasileiro, dos serviços públicos e dos direitos sociais mais basilares, ao lado da reforma da previdência propriamente dita (PEC 287/2016), da emenda do teto dos investimentos públicos (EC 95/2016), da reforma trabalhista, da lei da terceirização, etc.

“A reforma da previdência, por exemplo, se aprovada atuará de modo operacionalizado com a lei recém-publicada, porque propõe substituir em várias passagens da Constituição as expressões ‘doença’ e ‘invalidez’ por ‘incapacidade’ temporária ou permanente para o trabalho, com o fito de obrigar trabalhadores que se encontram afastados do trabalho e que, em alguns casos, seriam aposentados por determinação médica, a se reinserirem no mercado a qualquer custo, forçando situações de reabilitação profissional, isto é, mesmo que se entenda que a incapacidade para o trabalho é permanente, buscar-se-ia mudar o empregado de uma função para outra e não lhe conceder a aposentadoria por invalidez”, concluiu.