Somente em Alagoas, Sincor estima que 30 associações oferecem esse tipo de serviço
Repórter Janaina Ribeiro
A proposta é atraente e a vítima nunca consegue perceber que caiu numa armadilha. Convencida de que fez um bom negócio, ela só entenderá que foi enganada quando tentar acionar o suposto benefício e tiver dificuldade ou receber um ‘não’ como resposta. Estamos falando do seguro pirata de autos, que ganhou esse nome porque o serviço, apesar de parecer semelhante ao seguro ofertado pelos corretores credenciados, são considerados falsos por serem vendidos por pessoas ou entidades que não possuem qualquer regulação e nem estão sujeitas as regras da Superintendência de Seguros Privados (Susep), a autarquia vinculada ao Ministério da Fazenda responsável pelo controle e fiscalização do mercado de seguro, previdência privada aberta e capitalização. Em Alagoas, atualmente existem cerca de 30 associações que vendem esse tipo de proteção veicular. E, em todo o Brasil, estima-se um prejuízo de R$ 2,4 bilhões aos cofres públicos somente nesse segmento.
Ubirajara de Moraes Sarmento, que preferiu não mostrar o rosto, foi vítima do seguro pirata. Recentemente, ele comprou um carro zero e, claro, para se ver protegido de qualquer problema envolvendo o veículo, resolveu contratar uma proteção. O agricultor, que mora em Cacimbinhas, sertão alagoano, já tinha adquirido o serviço por uma seguradora autorizada em anos anteriores, mas, foi seduzido pelo vendedor da concessionária a trocar de empresa e comprar a chamada “proteção veicular”. Para isso, ele precisaria ir até Caruaru, local de uma loja filial da associação Innova Benefícios Sociais – cuja sede era em Minas Gerais. Pelo valor ofertado, valeria a pena a viagem até o estado vizinho.
“Pelo seguro normal eu pagaria R$ 2,1 mil, já pela proteção veicular, R$ 1 mil. Dai pensei: vou economizar R$ 1,1 mil e sair na vantagem. Como a propaganda feita para mim foi só falando dos benefícios, eu não me preocupei em pesquisar e, inocente, contratei o serviço. Só vim me dar conta do prejuízo quando um motoqueiro bateu no meu carro e tive que pagar, do meu próprio bolso, R$ 1,8 mil pelo conserto. Ou seja, o dano total a mim causado foi de R$ 2,8 mil”, contou ele.
“Eu liguei várias vezes para a Innova, mandei a documentação que pediram, mas sempre existia uma desculpa. Insisti por alguns dias, até a associação me dizer que não havia fundo para arcar com as despesas. Então, como eu precisava do meu carro para trabalhar, resolvi pagar o conserto. Até pensei em contratar um advogado, mas ele me pediu R$ 2 mil. Não compensaria pagar R$ 2 mil para receber de volta R$ 1 mil. Desisti e fiquei no prejuízo. Foi quando decidi procurar a minha antiga seguradora e contratar o seguro normal. Nunca mais caí nesse golpe. E agora sei que estou 100% protegido”, acrescentou
Sem resposta da Innova
Numa busca na internet, o site www.suainnova.com.br está desativado. Mas, segundo a vítima, quando da contratação da proteção veicular, a entidade entregou a ele um documento onde se dizia ser uma associação que trabalha com um “programa de assistência recíproca e mutualista de fruição exclusiva dos associados” e que é por meio dessa “cooperação que é possível a contratação coletiva de serviços e a promoção de reparação de eventuais danos sofridos nos veículos ou ressarcimento aos participantes do programa”.
No entanto, no portal www.
Entenda a diferença entre seguro e proteção veicular
O Sindicato dos Corretores de Seguros e de Capitalização, Previdência Privada e de Saúde no Estado de Alagoas (Sincor/AL) assegura
Outra fundamental diferença é que a proteção veicular não é regida por leis, nem tão pouco tem um órgão que fiscaliza as suas atividades. Portanto, não há garantia técnica dos serviços.
E para que o consumidor não tenha dúvida sobre qual empresa contratar, a Susep informou ao Seguro Notícias que a forma que oferece mais garantia a ele é fazer uma consulta no link http://www.susep.gov.br/menu/
E para facilitar melhor o entendimento do leitor, o portal Seguro Notícias preparou uma tabela com essas distinções.
Os dados alarmantes: 4,5 milhões de associados e prejuízo de R$ 9 bilhões
Estudo recente elaborado pela Federação Nacional dos Corretores de Seguros Privados e de Resseguros, de Capitalização, de Previdência Privada e das Empresas Corretoras de Seguros e de Resseguros (Fenacor) e pela Federação Nacional de Seguros Gerais (FenSeg) estima que aproximadamente 4,5 milhões de pessoas têm algum tipo de seguro pirata no Brasil, o que acaba por causar um prejuízo a mais de 80% desses consumidores. Por isso, as entidades, com suas unidades em cada estado, continuam fazendo o alerta à população para que ela entenda que, ao contratar a proteção veicular, o cliente não está adquirindo um seguro
Luiz Gutierrez, CEO da Mapfre (empresa global, especialista em prestação de serviços nos mercados segurador, financeiro, de saúde e assistência) e vice-presidente da FenSeg, explicou que o país precisa tratar desse tema com “seriedade e inteligência” porque o mercado de seguros piratas tem crescido de forma assustadora. “São 4,5 milhões de pessoas que não estão protegidas, muito menos conscientes sobre o assunto. Que fique claro que não estamos querendo atrapalhar o trabalho de ninguém. O que defendemos, na verdade, é que as empresas sigam as mesmas normas dos seguradores, de modo que possam realmente oferecer proteção aos consumidores que adquiriram o serviço”, defendeu ele, durante o 21º Congresso Brasileiro Nacional dos Corretores de Seguros, ocorrido no último final de semana, na Bahia.
E por falar em consumidores, a Fenacor faz uma alerta para o público mais jovem: essas associações costumam buscar um tipo de perfil específico para vender seus serviços. “São clientes mais novos, com idades que variam entre 18 e 45 anos e com renda abaixo de R$ 7 mil”, detalhou ao Seguro Notícias o presidente da Federação, Armando Vergílio dos Santos Júnior, acrescentando ainda que a incidência maior desse tipo de entidade se dá na região Sudeste, principalmente nos estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais e, ainda, em Goiás, no Centro-Oeste.
R$ 9 bilhões
Segundo a Fenseg, estima-se que esse mercado marginal, que só no ramo da proteção veicular reúne mais ou menos 1.090 associações em todos o país, por não ser regulado pela Superintendência de Seguros Privados (Susep) do Ministério da Fazenda, faz com que R$ 9 bilhões em impostos municipais, estaduais e federais deixem de ser arrecadados por ano em função do não pagamento das tarifas. Já o corretor de seguros, mesmo estando enquadrado no sistema do simples nacional, arca com as despesas do Confins, PIS e ISS. Ou seja, a depender do seu faturamento mensal, ele pode pagar entre 12 e 17% de impostos, sem falar nos encargos trabalhistas, a exemplo do FGTS.
E desse prejuízo total de R$ 9 bilhões, 27% deles são relativos ao mercado pirata de autos, de acordo com a pesquisa encomendada pela FenSeg e pela Fenacor. Ou seja, o dano aos cofres públicos representam algo em torno de R$ 2,43 bilhões somente neste ramo da pirataria.
O mercado paralelo em Alagoas tem mais de 30 associações (intertítulo)
Em Alagoas, de acordo com dados do Sincor, aproximadamente 30XX associações atuam no mercado de plano de garantia veicular. A AutoMais, a Delta e a Aliança Seguros são algumas delas. O seu_modus operandi_ funciona nos mesmos moldes de qualquer outra associação similar: elas oferecem, a preços mais reduzidos – tem mensalidade a partir de R$ 35,00 -, uma proteção veicular para o motorista. O cliente assina o contrato sob a promessa de que, caso aconteça qualquer problema com o seu veículo, ele ficará supostamente protegido para o valor do conserto ou do novo automóvel, em caso de perda total. E tal despesa será rateada entre todos os associados.
O portal Seguro Notícias se passou por cliente e procurou essas associações. A AutoMais, entidade que fica no bairro da Serraria, diz, em sua página no Facebook, que é a “seguradora que mais cresce no Brasil” e que o serviço da empresa “fará toda a diferença” na hora de dificuldade do consumidor.
Ela também afirma que “busca, de forma inovadora, soluções para a proteção do veículo e do bem estar do associado” e que esses são os dois “principais pilares que impulsionam o seu crescimento”. E continua: “Assim sendo, fique tranquilo e deixe para o especialista cuidar do seu patrimônio. Conte com a Associação que mais cresce no estado e no Nordeste”.
Diante de toda essa propaganda, buscamos informações sobre os serviços ofertados. A funcionária da associação informou que a proteção para moto custa R$ 35,00. Já para carro, a quantia gira em torno de R$ 90 mensais. Segundo ela, apenas uma única diferença existe entre esse tipo de entidade e uma corretora de seguros credenciada: a ausência de fiscalização pela Susep.
A Delta Proteção Veicular, que fica no bairro do Tabuleiro dos Martins, também alegou que não haveria diferença entre a associação e uma corretora de seguros. Inclusive, para tentar convencer a autora desta reportagem que o seu produto era mais vantajoso, o vendedor sugeriu a prática de uma fraude em caso de acidente por embriaguez ao volante. “Se Deus o livre você bater com o carro, sua esposa tem CNH? Não que eu queira lhe induzir pra que isso aconteça, até porque se beber, não dirija. Mas como já aconteceu, cliente meu bateu o carro num muro próximo a casa dele. O carro acabou a frente toda. Se o pessoal da perícia tivesse chegado antes, o seguro não teria coberto por conta de embriaguez ao volante, que é um dos motivos pra não haver cobertura. Só que pedi pra esposa dele ir responder como se fosse ela que tivesse batido. O carro dele hoje está mais novo que antes”, disse o funcionário sem nenhum constrangimento, como se não estivesse sugerindo um golpe contra o Código Brasileiro de Trânsito.
Já a Aliança Seguros fica em
Sincor/AL reforça o alerta para que consumidores não caiam no golpe
O Sincor/AL, claro, ratifica todas as advertências feitas pela Fenacor e pela FenSeg e reforça que, de fato, inexiste a relação de consumo entre a cooperativa e o cliente. “O serviço costuma ser ilegal e atrapalha muito o trabalho dos corretores que seguem a lei. Essas associações vendem o produto falando que é igual a um seguro, mas na verdade não é. Proteção veicular não é seguro, jamais será. É um produto pirata, é um produto falso. Infelizmente, aqui no estado esse é um tipo de praga que está se proliferando. Antigamente, elas só existiam em Maceió. Mas, agora, elas já estão espalhadas por vários interiores, principalmente Arapiraca, União dos Palmares, Palmeira dos Índios e Santana do Ipanema. São dezenas delas, mais de 30, que praticam esse tipo de atividade. E isso vem complicando demais o nosso mercado”, afirmou o presidente da entidade, Edmilson Ribeiro.
O Sindicato também informou que os ramos mais atingidos por esse mercado ilegal é o de carros leves, motocicletas e caminhões. “Esse pessoal atua muito no interior de Alagoas e isso ocorre, especialmente, em razão da falta de informação das pessoas. E dentre os veículos que mais possuem esse tipo de proteção, estão as motos e os caminhões. Para se ver uma ideia, a depender do caminhão, o seguro legal pode custar até R$ 15 mil. Mas aí as associações seduzem os motoristas oferecendo parcela de R$ 400 mensais. Só que, não se enganem, esse tipo de serviço não dá garantia de absolutamente nada”,informou.
Edmilson Ribeiro disse ainda que o Sincor tem recebido
E sobre os valores cobrados serem mais baratos, o Sincor chama a atenção da população: “Como não pagam quase nada de impostos, é claro que essas pessoas podem vender mais barato. Entretanto, fica mais uma vez o nosso aconselhamento para que ninguém caia nessa cilada. É sempre importante lembrar que o seguro legal protege o cliente de furtos, roubos, incêndios, acidentes e ainda cobre o prejuízo de terceiros por causa do contrato de responsabilidade civil. Além disso, para os casos de conserto, o serviço será feito nas concessionárias ou nas oficinas referenciadas e você ainda poderá ter direito a um cargo reserva. Sem falar que o corretor está 24 horas à disposição do cliente e, na hora de vender o serviço, vai procurar a melhor companhia de seguros, de acordo com o seu perfil, idade, tipo de carro, que são preocupações que as associações não têm. Portanto, seguro não é despesa, é necessidade e garantia de tranquilidade para o consumidor”, finalizou o presidente do Sincor.